É possível usucapir bem de família?

Érica Tacchi

Nos termos do Código Civil Brasileiro a instituição do bem de família se efetiva mediante escritura pública ou testamento, devendo, entretanto, se limitar a um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição.

O bem de família é constituído por prédio residencial urbano ou rural, com suas pertenças e acessórios, necessariamente destinado ao domicílio familiar.

Nesse sentido, a doutrina majoritária milita quanto a possibilidade de usucapir um bem que, apesar de formalmente definido como de família, materialmente não se destina a sua principal função, domicílio da família, seja por abandono ou mudança do imóvel:

Crucial é entender que a posse de um imóvel por alguém que não seja o proprietário, pelo prazo adequado à obtenção da usucapião, indica que o bem nunca chegou a receber a finalidade voluntária ou legalmente desejada a ele de bem de família. Ou seja, ele era formalmente bem de família, mas não era materialmente bem de família, pois ao ser abandonado pelo seu titular, fraudou a sua finalidade constitucional de servir como moradia da família, ou, ao menos, como fonte de renda mínima dessa família (v. g., aluguel do bem). (FARIAS; ROSENVALD, 2016, p. 401).

O bem de família, sobrevindo mudança ou abandono, é suscetível de usucapião. (…) A circunstância de haver sido instituído o imóvel, em sua integralidade, como bem de família pelo antecessor dos autores, Luiz Piccolo, não constitui motivo impeditivo ao aperfeiçoamento da usucapião. (Miguel Castro do Nascimento, Usucapião de bens Imóveis e Móveis, pág. 91, 6ª ed.).

O Superior Tribunal de Justiça segue o entendimento afirmando em seus julgados que a mudança ou abandono do imóvel possibilita a usucapião, inicialmente porque usucapião não é alienação de imóvel, mas aquisição originária, em segundo plano porque uma vez instituto o bem de família, deve-se consumar sua existência pela utilização do imóvel como domiciliar, conforme definição lega prevista no artigo 1.712 do Código Civil.

Portanto, o imóvel registrado mediante escritura publica como bem de família, poderá ser objeto de ação de usucapião, se verificada ausente a condição prevista em lei de servir-se como domicílio familiar, seja por abandono ou mudança do imóvel.

Roesel Advogados