Os aplicativos de entrega de alimentos e comida, como ifood, é uma empresa que se
autodominam como de tecnologia, em forma de aplicativo, realizando a venda de produtos
alimentícios que são entregues por motoristas parceiros na residência de seus clientes, ora
usuários.

Neste ponto, vê-se que os aplicativos fazem toda a gestão do negócio, estipulando
regras a serem seguidas pelos motoristas e entregadores cadastrados, fornecendo equipamentos
para a prestação dos serviços (como bolsas térmicas com a logomarca do aplicativo) e,
principalmente, definindo unilateralmente o preço do serviço.

Conforme destacam Cláudia Lima Marques e Bruno Miragem (2015), os aplicativos
atuam como verdadeiros “guardiões do acesso”, criando uma espécie de confiança e gerando a
“base do comportamento das partes, levando-as a aderir ao modelo de negócio e por intermédio
de determinada plataforma (site ou aplicativo), manifestar a vontade de celebrar o negócio”.

Significa dizer, em outras palavras, que a presença do aplicativo é o fator determinante
para a contratação do serviço pelo usuário, que certamente não contrataria aquele motorista ou
entregador se não tivesse respaldo na segurança propiciada pelo modelo de negócio gerido pelo
aplicativo. – Se a própria plataforma define as regras do -jogo, inexiste mera intermediação.

A atividade econômica da empresa de delivery de refeições, é por si só a entrega das
refeições, sendo os motoristas parte essenciais para que seja realizado o referido serviço, visto
que sem ele não seria obtido o objetivo final comercializado. Diante disso, o objeto social não
está adstrito somente a ser plataforma digital que consumidores a restaurantes, mas notadamente
porque, sem o efetivo transporte do alimento, que é feito pelos motoristas, o seu modelo de
negócios não se aperfeiçoa e a empresa não aufere renda

A doutrina conceitua ainda os aplicativos no Código de defesa dos consumidores,
portanto, sendo fornecedores de serviço.

Sendo assim, deve ser reconhecida a natureza da prestação dos serviços do aplicativo
IFood como prestador de serviço, assim reconhecendo a sua responsabilidade solidária para
restituir os danos a Autora, sendo inclusive aplicado a este caso as normas consumeristas, como
o ônus da prova.
A questão ainda não é pacificada, diante disso, há duas correntes sobre o tema.

1) Não possibilidade – não há qualquer relação contratual entre os aplicativos e os
terceiros eventualmente envolvidos no acidente. Desta forma, poderia se cogitar,
em uma primeira análise, a inexistência de responsabilidade dos aplicativos por
danos causados a terceiros. Ilegitimidade passiva dos aplicativos diante de
inexistência de relação contratual e consumo, não podendo ser o motorista
solidariamente responsável. Isto porque, segundo os magistrados, a empresa Uber
“não é a proprietária do veículo envolvido no acidente, limitando-se sua atividade a
facilitar a aproximação entre os interessados no serviço de transporte de passageiros
e os prestadores desse serviço”.
Note-se, portanto, que a exclusão da possível responsabilidade solidária e objetiva do
aplicativo foi fundamentada no fato de que os serviços prestados pela Uber teriam natureza de
“serviços de intermediação” ou “de tecnologia”, e não de transporte.

2) Possibilidade – Os aplicativos móveis são fornecedores de serviços (seja de
intermediação, seja de transporte e/ou delivery), aplicável, à hipótese, o regramento
do Código de Defesa do Consumidor, que equipara a consumidor os terceiros
vítimas dos acidentes de consumo (art. 17 do CDC).Conforme explica Bruno
Miragem (2016, p. 161), referida equiparação parte do pressuposto de que a
garantia de qualidade e segurança vincula-se ao produto ou serviço ofertado
no mercado de consumo, e não ao contrato de fornecimento, cabendo ao terceiro
vítima de um acidente de consumo, enquanto consumidor equiparado, apenas
realizar a prova de que o dano sofrido decorre de um defeito do serviço prestado
pelo fornecedor a outrem (este sim consumidor padrão ou standard, nos termos do
art. 2º do CDC).

A proteção conferida pelo ordenamento jurídico ao terceiro vítima de acidentes de
consumo, ainda que não tenha sido ele o contratante dos serviços prestados pelo fornecedor, se
justifica pela relevância social dos interesses protegidos pela norma, quais sejam, a segurança, e
a prevenção e reparação de danos à saúde e integridade física. Para que haja a responsabilidade
do fornecedor, porém, é necessário que os danos sofridos pelo terceiro sejam desdobramento
lógico e imediato de um fato do serviço, isto é, que possuam com ele relação direta de
causalidade, e não apenas relação indireta (CAVALIERI FILHO, 2019, p. 87-89).

Em apertada síntese, conclui-se que, independentemente da natureza dos serviços
prestados pelos aplicativos, não há dúvidas de que estes atuam no mercado de consumo como
fornecedores, atraindo a incidência do Código de Defesa do Consumidor.Com efeito, sendo os
acidentes de trânsito verdadeiros acidentes de consumo (fatos do serviço), aplicável à hipótese a
regra prevista no art. 17 do CDC, que equipara à figura do consumidor os terceiros vítimas dos
acidentes de consumo, desde que haja nexo causal direto entre os danos por eles sofridos e o
fato do serviço. O aplicativo, portanto, responderá por danos causados por seus parceiros
(motoristas e entregadores) a terceiros, em razão dos acidentes de trânsito, de forma objetiva,
com fulcro nos artigos 12 e 17 do CDC.
No que se refere à responsabilidade civil do aplicativo perante terceiros envolvidos no
acidente, embora existam entendimentos em sentido diverso, conclui-se que também haverá a da
plataforma digital de forma objetiva, na medida em que o terceiro vítima de acidente de
consumo equipara-se a consumidor, nos termos do art. 17 do CDC.

DRA. DÉBORA SAMYRA MENDES SANTOS

Roesel Advogados.